As vozes da ditadura: os áudios secretos do STM

“Condená-lo em bases jurídicas é completamente inexequível. Agora, nós vamos tomar, eu vou tomar uma decisão revolucionária. Estamos hoje preservando o regime revolucionário, a irreversibilidade dos objetivos revolucionários, não podemos de maneira nenhuma deixar de fazer isso.” Foi assim que o general Rodrigo Octavio, do Superior Tribunal Militar (STM), justificou seu voto para condenar o ex-deputado federal Márcio Moreira Alves no STM.

A revista ÉPOCA apresenta gravações inéditas dos julgamentos secretos de presos políticos pelo STM. Esses arquivos revelam como alguns ministros por vezes ignoravam a lei – e desdenhavam de denúncias de tortura – para condenar réus de acordo com os interesses do regime.

Em 1969, o Código de Processo Penal Militar estabeleceu que os julgamentos no STM ocorreriam em sessões secretas, que passariam a ser gravadas em 1975. O Supremo Tribunal Federal agora determinou que 300 horas de gravações dessas sessões sejam tornadas públicas.

O STM, em Brasília, era a última instância para os recursos em julgamentos de presos políticos – Heleno Cláudio Fragoso atuou perante o tribunal, na defesa desses presos, durante a ditadura.

O Ato Institucional nº 2 (AI-2), de 1965, autorizou o STM a julgar quem atentasse contra a “segurança nacional”. Os áudios mostram que os ministros por vezes declaravam, em sessões fechadas, que optavam por decidir contra a própria lei.

A matéria mostra o caso do ex-deputado federal Márcio Moreira Alves, cassado após fazer um discurso no plenário da Câmara, em 1968, em que pregava o boicote ao desfile militar de 7 de setembro e sugeria que as moças brasileiras se recusassem a namorar cadetes e militares, em geral.

O discurso teria sido a gota d’água para a edição do Ato Institucional nº 5, de 13 de dezembro de 1968, que, entre outras restrições, autorizava o presidente da República a decretar o recesso do Congresso Nacional (só seria reaberto em outubro de 1969); intervir nos estados e municípios; cassar mandatos de parlamentares; suspender a garantia do habeas corpus e os direitos políticos de qualquer cidadão por dez anos.

Segundo a revista, “o STM não entregou justiça a Moreira Alves. Os ministros presentes naquela manhã reconheceram que a lei tornava impossível a condenação de um deputado por discursos feitos durante seu mandato. Mas aquele ex-parlamentar, traidor da pátria, não podia ficar impune. Um a um, os magistrados, com desassombro e tranquilidade, foram criando artifícios retóricos para ignorar a legislação”, diz a reportagem.

General de Exército, o ministro Rodrigo Octávio disse que o STM deveria agir como um “tribunal de segurança”, não um “tribunal de Justiça”. O almirante de esquadra Octávio José Sampaio Fernandes recorreu a um antigo integrante da Corte:

“O que se procura aqui é fazer a justiça, evidentemente dentro da lei. Mas o saudoso ministro Alcides Carneiro já teve aqui uma vez uma expressão: ‘Se se trata de fazer justiça, mesmo que ela fira a lei, deve-se fazer justiça’. No caso em apreço, a condenação desse moço, no meu entendimento, é um ato de justiça”.

Leia aqui a reportagem completa da revista ÉPOCA.